O lançamento recente do programa "Mais médicos" por parte do governo
federal foi anunciado como uma tentativa de aumentar o número de
profissionais da saúde atendendo nas mais remotas regiões do país. Por
louvável que seja a iniciativa, as críticas apresentadas pela oposição
são absolutamente legítimas e compreensíveis em razão da recorrentemente
evidenciada incapacidade do governo em gerir os recursos públicos com
critério e decência.
Um fator decorrente deste processo, no
entanto, vem ultrapassando nos últimos dias a etapa meramente política
do embate entre as forças que apoiam e se opõem ao governo federal. A
chegada de médicos cubanos para trabalhar no Brasil trouxe a tona uma
onda de xenofobia que em diversos momentos vem beirando as
lamentavelmente resistentes agruras do fascismo.
Em Minas Gerais,
o Conselho Regional de Medicina agiu rápido para barrar a presença de
médicos cubanos atuando no estado. No Ceará, um grupo de médicos foi ao
Aeroporto de Fortaleza receber com vaias e ofensas morais seus colegas
de profissão que acabavam de sair de seu país de origem para trabalhar
no nosso.
E as demonstrações de preconceito não se restringiram
apenas aos médicos. Seja nas ruas, seja nas redes sociais, não tem se
tornado raro assistir à depoimentos recheados de xenofobia que
questionam inclusive a fisionomia dos cubanos perguntando se tratam-se
de "médicos de verdade".
Infelizmente, para muitos de nós,
brasileiros, chega a ser agressivo o fato de que pessoas com a cor da
pele escura, oriundas de classes humildes, se formem em medicina. O que
mais chama atenção é notar que não apenas por serem estrangeiros, mas
principalmente por serem de Cuba, há ainda mais fervor nas tristes
manifestações de discriminação.
Quando visitei Cuba pela primeira
vez, em 2006, conheci estudantes brasileiros de medicina que me
disseram que quando encerrassem o curso iriam escolher entre Portugal,
Espanha e Austrália para trabalhar, já que o governo brasileiro não
reconhecia os diplomas da Escola Latino-americana de medicina, com sede
em Havana.
Portugal, Espanha e Austrália são apenas três entre as
dezenas de países em que há milhares de médicos cubanos atuando,
resultado de convênios bilaterais firmados por estas nações junto ao
governo de Cuba.
As lamentáveis reações de conservadorismo
exacerbado por partes de alguns brasileiros poderiam remeter ao fato de
que nossas unidades básicas de saúde e hospitais já estão abarrotadas de
médicos, enfermeiros e agentes comunitários, e que por isso não existem
problemas como filas para o atendimento e superlotação.
Estes
"indignados" com a vinda dos cubanos claramente desconhecem a realidade
absolutamente oposta. Ignoram que todos os dias se formam longas filas
de trabalhadores, crianças e mulheres esperando horas, dias, meses para
serem atendidos no SUS.
Muito mais do que outro enfadonho cenário
de conflito entre governistas e oposicionistas, apresenta-se para nós
como uma tarefa de humanismo e internacionalismo dar as boas vindas aos
médicos cubanos e nos desculpar pela postura vergonhosa assumida por
pessoas que evidentemente jamais recorrerão ao sistema público de saúde.
Médicos,
professores, jornalistas. Cubanos, senegaleses, dinamarqueses. Quem vê
diferença entre eles vive no lugar errado, no milênio errado, olha para o
mundo do jeito errado.
*Secretário de Comunicação do PPS-MG e EX membro da JPS
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